Após décadas de debates, o Brasil finalmente aprovou a reforma tributária.
Porém, ainda é cedo para celebrar a simplificação e a desburocratização almejadas durante décadas, porque ainda existem muitas incertezas acerca das regras que nortearão o novo sistema e garantirão a isonomia fiscal e a diminuição do contencioso judicial.
A unificação de ICMS, ISS, PIS, Cofins no IBS e na CBS, além da uniformização das regras — em tese, uma ideia simplificadora —, na prática, esconde armadilhas profundamente preocupantes. A extinção gradual do ICMS desmonta uma estrutura conhecida, por mais complexa que seja, para substituí-la por um sistema cujos detalhes operacionais e impactos reais ainda são uma incógnita.
A coexistência de sistemas durante a transição (de 2026 a 2032) pode ser um convite ao caos administrativo e a conflitos interpretativos que podem paralisar negócios — um verdadeiro purgatório até a (possível) redenção.
Algumas questões precisam ser esclarecidas para não tornar o novo sistema, que sai de um “manicômio” tributário, em um “inferno” fiscal e jurídico. Recentes interpretações do fisco levantam a hipótese de incluir o IBS e a CBS na base de cálculo do ICMS e do ISS durante o período de transição.
Essa tese, se prevalecer, poderá significar um retrocesso ao modelo que a reforma buscou superar, com sérios reflexos para o empresariado brasileiro. A inclusão do IBS e da CBS nas bases do ICMS e do ISS aumentaria substancialmente o valor dos bens e dos serviços. Além da carga tributária maior, isso se traduz em elevação dos custos de compliance e, inevitavelmente, aumento de litígios.
Por outro lado, o coração desta reforma está na não cumulatividade, que estabelece que o tributo pago em uma etapa da cadeia de produção ou comercialização pode ser abatido (creditado) nas etapas seguintes. Em outras palavras, o contribuinte só paga imposto sobre o valor que realmente agregou ao produto ou serviço, evitando que um tributo seja cobrado em cima de outro (o famoso efeito cascata).
A transição mais longa estabelecida para o IBS, que substituirá o ICMS e o ISS, revela-se fundamental diante da ampla variedade de benefícios fiscais atualmente existentes no âmbito do ICMS, permitindo uma adaptação gradual dos setores hoje favorecidos e reduzindo os desdobramentos econômicos da mudança. Nesse contexto, a extinção progressiva desses incentivos representa um passo importante para equalizar a concorrência e privilegiar a eficiência produtiva, em detrimento das vantagens concedidas.
Essa mudança não é meramente contábil. Trata-se de uma reengenharia da relação entre o Estado e o contribuinte. A unificação dos tributos sobre o consumo sob a égide do IBS e da CBS reduzirá drasticamente a burocracia, se bem regrada, permitindo que os empreendedores brasileiros foquem no que realmente importa: inovar, crescer e gerar empregos.
O futuro se discute no presente
A implementação da reforma tributária trará questões que precisam ser compreendidas e debatidas desde já. Para aprofundarmos essa discussão de alto nível, o 7º Congresso do Codecon-SP de Direito Tributário, que acontecerá no próximo dia 26 de novembro, em São Paulo, oferecerá uma oportunidade ímpar para empresários, contadores, advogados, gestores públicos e estudiosos do Direito Tributário.
O encontro vai reunir os maiores especialistas do país para analisar os detalhes da transição, os impactos do IBS, o fim dos benefícios fiscais e as estratégias para que as empresas não apenas se adaptem, mas se fortaleçam nesse novo ambiente.
Os participantes terão a honra de acompanhar as apresentações de Heleno Torres e Simone Barreto sobre regimes diferenciados e específicos e benefícios fiscais atuais; de Argos Simões e Robson Maia Lina sobre o contencioso tributário no cenário pós-reforma; e de Paulo César Duarte e Alessandra Vieira, que abordarão a importância da tecnologia para a transição do novo sistema tributário.
A reforma tributária pode ser uma janela de oportunidade para construirmos um sistema mais justo e eficiente, desde que o legislativo ouça os anseios do setor produtivo, que sabe quais são os obstáculos que minam os desenvolvimentos econômico e social do país.
Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon/SP), vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) e presidente do Conselho de Assuntos Tributários da Entidade
Artigo originalmente publicado no portal Jota em 13 de novembro de 2025.
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Fonte Oficial: https://www.fecomercio.com.br/noticia/purgatorio-tributario-pode-nos-levar-ao-ceu-ou-ao-inferno