A polarização política se tornou um lugar comum nas democracias. As pesquisas de opinião pública nos EUA mostram que para 57%, as divisões entre os partidos políticos recebem excessivo espaço no debate público, deixando de lados os temas de interesse do eleitorado, de acordo com os dados do Pew Research Center. Mais do que isso, as evidências empíricas mostram que o antagonismo entre os principais partidos é crescente. Em 1994, apenas 17% das pessoas que se identificavam com o Partido Democrata tinha uma imagem desfavorável do Partido Republicano, a despeito da rivalidade eleitoral histórica entre as legendas, dado que estamos falando de um sistema eleitoral do tipo bipartidário. Não estamos falando propriamente de um país sem conflitos, o que poderia justificar uma leitura empática do adversário político.
Os EUA enfrentaram duas grandes guerras, guerra civil, depressão econômica e lutas sociais. A desconfiança entre pessoas dos diferentes partidos atinge níveis assustadores: 54% entre democratas e 62% entre os republicanos. A divisão entre os principais grupos políticos é também presente no contexto europeu, a despeito dos diferentes arranjos institucionais. Os partidos políticos estão cada vez mais distantes em termos ideológicos com movimentos eleitorais que saem das legendas mais moderadas em direção aos extremos do espectro político, aumentando a fragmentação partidária. A gestão de coalizão de governo, que seria mais fácil, em sistemas parlamentaristas tem um custo político mais elevado, ameaçando inclusive os pilares políticos do projeto comum europeu.
BRASIL
O caso brasileiro não é exceção. Os dois principais nomes nas pesquisas eleitorais, Lula e Bolsonaro não são propriamente figuras populares entre os eleitores. De acordo com o último levantamento da Quaest, de um mês atrás, para 58% o presidente não deveria se candidatar à reeleição, ao passo que Bolsonaro deveria apoiar outro candidato na visão de 65% dos eleitores. A polarização brasileira, contudo, nesse momento tem algo de peculiar: sabemos que temos polarização política, mas não conhecemos nem o partido, nem o candidato de um dos polos do conflito. Não sabemos o nome e tampouco o partido de quem irá enfrentar a provável candidatura à reeleição do presidente.
Sob essa ótica, os últimos movimentos dos líderes partidários parecem jogar luz nas incertezas do quadro eleitoral. À primeira vista, oposição e governo parecem trabalhar com a candidatura presidencial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Os governistas que “ignoravam” o mandatário do maior colégio eleitoral do país nas referências públicas, assumiram essa dualidade. O ministro Renan Filho assumiu o papel de linha de frente questionando o trabalho o desempenho do governador. Tarcísio, por sua vez, segue com agenda pública quase que diariamente falando em termas nacionais “quarenta anos em quatro” e erguendo símbolos ligado ao ex-presidente Bolsonaro.
Os números mostram quadro que sugere elevada incerteza para o resultado da eleição presidencial. De um lado, a pesquisa Quaest mostrou que Tarcísio ainda não vence Michelle na preferência de quem deveria ser o candidato da direita em 2026. A relutância do governador em enviar sinais ao bolsonarismo parece encontrar eco nos dados; entre bolsonaristas 36% querem a ex-primeira-dama contra apenas 15% de apoio à esperança do mercado financeiro para enfrentar o Lula. Os números apontam que há exagero na afirmação de que Tarcísio é o único nome competitivo para enfrentar o petismo em 2026.
Essa leitura é mais um desejo por parte dos agentes econômicos e uma saída legítima para a elite política deixar de lado o bolsonarismo, especialmente após a celeuma envolvendo Eduardo Bolsonaro e a aplicação de tarifas e punições para o país. Grosso modo, todas simulações em primeiro turno mostram o antipetismo um pouco acima dos 30%, independente do candidato/a, o que aponta para ausência de uma imagem consolidada no eleitor de cada candidato. Além disso, os dados da pesquisa Quaest mostraram que o tempo não tem feito bem para a imagem de Tarcísio.
Em janeiro de 2025, 45% afirmavam não conhecer o governador de São Paulo, ao passo que esse número cai para 34%. Os eleitores que afirmam conhecer, mas sem intenção de votar subiu de 32% para 39%, em linha com o aumento na rejeição do campo bolsonarista que acaba impactando nomes ligados ao ex-presidente. Por outro lado, a recente pesquisa da Atlas mostra Tarcísio na frente da campanha de reeleição, o que deverá aumentar o poder de atração do potencial projeto presidencial justamente no momento de encaminhamento da candidatura da direita. Aos meus olhos, a variável chave nas chances reais de Tarcísio é a sua relação com o bolsonarismo.
As mensagens vazadas com fala de Eduardo Bolsonaro não mostram propriamente um olhar empático para relação do seu pai com Tarcísio. Na verdade, a leitura do projeto do governador de São Paulo é de desconfiança; o bolsonarismo sabe que, uma vez eleito, o grupo se torna subordinado na vida política nacional.
Quanto mais Bolsonaro demorar para definir sua estratégia para 2026, maior o desafio de Tarcísio.
RAFAEL CORTEZ
Doutor em Ciência Política (USP), professor do IDP-SP e sócio da Tendências Consultoria.
Fonte Oficial: https://agenciadcnews.com.br/artigo-por-rafael-cortez-o-antipetismo-ganha-nome-plano-tarcisio-comeca-a-tomar-forma/