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O ‘efeito bumerangue’ do voluntarismo judicial no campo trabalhista


Judiciário precisa ser mais previsível e alinhado com o marco regulatório vigente, garantindo mais segurança para aqueles que desejam investir e operar no Brasil (Arte: TUTU)

Um estudo realizado pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) aponta que a insegurança jurídica no campo trabalhista, estimulada, em grande medida, por decisões judiciais de caráter voluntarista, tem gerado custos bilionários a empresas e setor público. Essa instabilidade afasta investidores, eleva os custos das operações empresariais e compromete a oferta de empregos formais no Brasil. 

A origem desse problema está, muitas vezes, em interpretações extravagantes das leis trabalhistas por parte do Judiciário, que frequentemente se desvinculam do marco legal vigente, provocando ações e reações dos agentes econômicos, uma postura que cria um efeito cascata de incertezas. Juristas e economistas envolvidos no estudo destacam um ponto basilar: muitas das decisões judiciais tomadas com o objetivo de proteger os trabalhadores acabam causando reflexos contrários, dificultando contratações formais, reduzindo oportunidades de empregos e desestimulando investimentos. José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP, explica que essa dinâmica gera o que é conhecido como “efeito bumerangue”, em que a tentativa de beneficiar uma classe acaba prejudicando a própria economia que a sustenta.

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“Nem sempre aquilo que o legislador ou o julgador pretende proteger e beneficiar alcança o resultado esperado. Essas sentenças acabam contrariando os próprios objetivos. Em razão dessas externalidades, muitas decisões acabam mais prejudicando do que ajudando”, enfatiza Pastore. “Todo direito tem um custo. Todo benefício gera uma despesa. E é fundamental levar isso em conta, porque, em muitos casos, os custos acabam sendo superiores aos benefícios.”

Como agravante, as situações analisadas do estudo “se multiplicam por outras centenas de milhares que existem no Brasil, em contextos em que as sentenças vão se afastando das leis e, às vezes, são até contra elas”, adverte Pastore. 

Prejuízo bilionário: o custo da insegurança jurídica trabalhista

O levantamento da FecomercioSP analisou dez temas relevantes do Direito do Trabalho para demonstrar, com casos reais, os impactos financeiros de interpretações judiciais voluntaristas. Ao todo, a estimativa de custos varia entre R$ 1 bilhão e mais de R$ 6 bilhões, dependendo da situação. Esse custo, que abrange diferentes setores da economia,se reflete no custo de bens e serviços para os consumidores.

O enfoque do estudo está no prejuízo advindo de decisões imprevistas, aquelas que surpreendem o empregador que aplica a legislação como estabelecida, crendo que se encontra em situação de regularidade e se defronta com pronunciamentos judiciais baseados em interpretações peculiares das leis ou, até mesmo, no distanciamento da legislação.

Dentre os principais fatores que estimulam esses custos, destacam-se o excesso na concessão da gratuidade para o ajuizamento de ações trabalhistas, a instabilidade na terceirização, a desconsideração de acordos coletivos e a dúvida quanto à aplicação da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017). Para se ter uma ideia, somente no fim de 2024 o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que as normas da Reforma Trabalhista também se aplicam aos contratos que já estavam vigentes quando a lei entrou em vigor, em novembro de 2017 — isso, após a afetação de diversos recursos repetitivos para discutir a aplicação temporal das normas. 

Impactos de decisões judiciais controversas

O estudo aponta casos específicos em que interpretações judiciais geraram enormes passivos financeiros para empresas, como:

  • gratuidade judicial: aproximadamente 76% dos reclamantes na Justiça do Trabalho obtêm isenção de custas, mesmo quando os reclamantes têm boas condições financeiras, mas declaram não poder arcar com o custo das despesas judiciais, de forma que estas são transferidas para o Erário. Só nos últimos cinco anos, o Judiciário custou aos cofres públicos R$ 1,1 bilhão com isenções e cerca de R$ 100 milhões por ano em pagamento dos peritos que atuam em processos; 
  • aposentadoria especial e insalubridade: em 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou uma nova interpretação sobre a aposentadoria especial, elevando a contribuição previdenciária dos empregadores cujos funcionários estão expostos a agentes nocivos. Essa interpretação foi replicada pela Justiça do Trabalho, que concedeu adicionais de insalubridade a diversos trabalhadores de forma automática, resultando em custos judiciais superiores a R$ 1,5 bilhão nos últimos cinco anos; 
  • terceirização contestada: apesar de o STF ter reconhecido a constitucionalidade da terceirização para qualquer atividade em 2020, decisões trabalhistas continuam anulando contratos empresariais, o que gerou mais de 40 mil ações na Justiça do Trabalho nos últimos cinco anos, gerando despesas bilionárias aos empregadores sobre um tema já consolidado; 
  • direitos trabalhistas e precedentes econômicos: empresas que seguem a legislação ainda assim enfrentam decisões divergentes da Justiça. Um exemplo é a resistência ao princípio de que “o negociado deve prevalecer sobre o legislado”, o que resulta na anulação de convenções coletivas e gera custos igualmente na casa dos bilhões.

“No Brasil, as leis e sentenças judiciais precisam ser vistas como incentivos ou desincentivos para a atividade econômica. Se não há previsibilidade no cumprimento das leis, fica difícil atrair investimentos e garantir estabilidade no mercado de trabalho”, afirma Pastore. 

Especialistas ouvidos no estudo e nos eventos realizados pela FecomercioSP são unânimes ao defender a necessidade de um Judiciário mais previsível e alinhado com o marco regulatório vigente, garantindo mais segurança para aqueles que desejam investir e operar no Brasil. 

O jurista Ives Gandra Martins, presidente do Conselho Superior de Direito da FecomercioSP, ressalta que a harmonia entre os poderes é essencial para restaurar a confiança da iniciativa privada. “Quando o Judiciário assume posicionamentos interpretativos que extrapolem o seu papel, os impactos são sentidos diretamente sobre a confiança dos investidores e a previsibilidade econômica”, aponta.

O estudo foi realizado com o apoio de ferramentas de jurimetria da Data Lawyer. A análise minuciosa em torno dos dez casos compõe um livro lançado em março de 2025 pela Entidade e é um dos temas explorados nas reuniões do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho. Acesse o livro na íntegra!

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Fonte Oficial: https://www.fecomercio.com.br/noticia/o-efeito-bumerangue-do-voluntarismo-judicial-no-campo-trabalhista

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