Retomada dos investimentos depende da continuidade e da previsibilidade na gestão pública
(Arte: TUTU)
Por Abram Szajman*
Alternância de poder é um pressuposto da democracia. Contudo, nos países desenvolvidos, quando se muda o governo, não se alteram políticas públicas recém-implantadas nem se modificam abruptamente as regras de impacto na esfera econômica, como acontece no Brasil. Nesse caso, a consequência é evidente: as chances e a expectativa de retorno do capital se reduzem drasticamente à medida que a insegurança jurídica ou fiscal cresce.
Vejamos, no plano macroeconômico, as discussões acerca da substituição do teto de gastos, instituído em 2017. Passados seis anos, a regra fiscal está posta em xeque e na iminência de ser substituída por um novo arcabouço fiscal de contornos imprecisos, sem a garantia de que o Estado se torne mais eficiente e menos pesado.
Tome-se ainda o caso da reforma trabalhista, aprovada também em 2017, que apresenta resultados notáveis quanto à redução dos processos judiciais, apesar de as regras ainda estarem em fase de adaptação na rotina das empresas. Parte do espectro governista, porém, aventa a revisão de alguns desses dispositivos, o que acarretaria mais insegurança jurídica.
Entretanto, o maior obstáculo para quem deseja empreender está na esfera tributária. A reforma ampla do sistema, ensaiada nos últimos 20 anos, não se concretiza em razão da ganância dos três níveis de governo, sempre dispostos a manter ou ampliar gastos correntes. Para ilustrar o “manicômio tributário”, 46 novas regras são criadas todos os dias, fazendo com que as empresas arquem com um custo anual superior a R$ 50 bilhões, entre equipes, sistemas e equipamentos. Ademais, enquanto a simplificação permanece no campo das promessas, os retrocessos são palpáveis, como na edição da medida provisória (MP) que determinou o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
A Constituição federal tem 163 dispositivos ainda não regulamentados. É preciso conviver, também, com essa “jabuticaba” brasileira que é a MP. Devia ser exceção, mas tornou-se regra, com 241 MPs editadas no governo passado.
Uma centena delas caducou por falta de votação e quando isso ocorre, os efeitos gerados durante a sua validade entram num limbo jurídico de difícil solução.
Parafraseando conhecido comentarista de futebol, “a regra é clara”, e se, em campo, o juiz, ao passar por cima dela, acaba por instaurar a confusão, na economia, compromete as possibilidades de crescimento. Sem estabilidade e respeito às regras, quem vai se arriscar a jogar? A retomada dos investimentos depende da continuidade e da previsibilidade na gestão pública, pois o dinheiro não aceita desaforos.
*Abram Szajman é presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 20 de abril de 2023.
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Fonte Oficial: FecomercioSP