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Do papel à inovação: a revolução da Inteligência Artificial no Direito

* Por Fabricio Visibeli

A Inteligência Artificial (IA) está transformando de forma silenciosa, e profunda, a rotina dos profissionais do Direito. Petições, transcrições e análises de grandes volumes de documentos jurídicos estão deixando de ser tarefas manuais e repetitivas para se tornar processos automatizados e orientados por dados.

Mais do que uma simples troca de ferramentas, a IA está redesenhando a dinâmica operacional dos escritórios e departamentos jurídicos, liberando tempo para aquilo que é essencial: a interpretação, a estratégia e a decisão.

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Ao contrário do senso comum, essa mudança não tem provocado a eliminação direta de postos de trabalho, mas sim uma reconfiguração das funções. O novo modelo de trabalho tende a ser dividido entre:

  • IA: triagem, síntese, formatação e acompanhamento de processos.
  • Advogado: interpretação, argumentação, negociação e decisão.

Quando todas essas etapas passam a ser executadas de forma integrada em uma plataforma única de automação jurídica, o fluxo de trabalho deixa de ser fragmentado e ganha coerência. O processo torna-se contínuo: começa no recebimento das demandas, segue para a organização dos documentos, avança para a geração de minutas e se estende ao acompanhamento processual e à análise de dados, tudo conectado em um mesmo ambiente. Essa orquestração não apenas reduz retrabalho e padroniza entregas, como também aumenta a previsibilidade para o gestor jurídico, permitindo que as equipes direcionem tempo e energia para atividades estratégicas de maior impacto.

O Brasil como epicentro da transformação

Embora essas ferramentas estejam sendo adotadas em todo o mundo, é no Brasil que a revolução promete ser mais intensa. O país concentra cerca de 80 milhões de processos em tramitação, distribuídos entre as múltiplas esferas da Justiça: Federal, Estadual, do Trabalho, Eleitoral, Militar (Federal e Estadual) e o TJDFT. Nenhum outro sistema jurídico no planeta apresenta essa complexidade.

A situação se agrava com o labirinto tributário nacional, responsável por aproximadamente 30 milhões de ações ainda pendentes. Trata-se de um ambiente que combina alto volume, baixa produtividade e grandes oportunidades de ganho com automação inteligente.

As quatro tecnologias que estão moldando o novo Direito

1. Modelos de Linguagem (LLMs)

Muito além de assistentes de texto, os grandes modelos de linguagem já são capazes de redigir petições completas com base em contexto jurídico, sempre sob a supervisão de um advogado. Essas ferramentas padronizam a linguagem técnica entre profissionais, garantem conformidade com normas processuais específicas e reduzem o tempo gasto na produção de peças.

Além da redação, esses modelos funcionam como motores centrais de padronização e controle: organizam informações vindas de diferentes fontes, conectam dados de sistemas processuais, geram minutas coerentes com o histórico do caso e armazenam versões automaticamente. Assim, os LLMs deixam de atuar apenas como assistentes de texto e passam a integrar a própria infraestrutura do fluxo jurídico, tornando o trabalho mais confiável, contínuo e inteligente. 

2. Transcrição e Reconhecimento de Voz

Apesar de parecerem banais, as tecnologias de speech-to-text oferecem ganhos expressivos de produtividade. 

Audiências, sustentações orais e diligências podem ser transcritas automaticamente, liberando advogados juniores de tarefas manuais. Além disso, atas, memoriais e reuniões com clientes passam a ser documentadas com precisão e economia de tempo. 

3. Jurimetria e Legal Analytics

Essa é, talvez, a frente mais sofisticada, e também a mais controversa. A jurimetria aplica estatística e aprendizado de máquina para identificar padrões de decisão em tribunais, câmaras e relatorias, orientando estratégias jurídicas com base em dados reais. Em vez de depender apenas da intuição, o advogado passa a contar com insights preditivos sobre tendências jurisprudenciais, aumentando a chance de êxito processual. 

Quando combinada com a automação operacional, a jurimetria deixa de ser apenas um painel estatístico e passa a influenciar diretamente o fluxo de trabalho: modelos preditivos podem sugerir estratégias, priorizar casos, indicar riscos e até acionar automaticamente etapas específicas do processo. Assim, a análise de dados passa a orientar a alocação de tempo e recursos, ampliando a eficiência e elevando a assertividade das decisões dentro do departamento jurídico. 

4. Automação Robótica de Processos (RPA) + IA

A combinação entre RPA e IA é vital para escritórios de qualquer porte, especialmente os menores, que precisam evitar o desperdício de horas com tarefas burocráticas. Essas ferramentas monitoram prazos, fazem protocolos, acompanham andamentos e enviam notificações automáticas. Sistemas mais avançados já conseguem distinguir movimentações relevantes (como abertura de prazo) de meros expedientes, disparando alertas inteligentes e gerando minutas pré-preenchidas para revisão.

À medida que a automação jurídica evolui, cresce também a necessidade de governança digital. Plataformas que centralizam fluxos e dados permitem auditorias completas, registro de versões, rastreabilidade de atividades e controle granular de acesso, elementos essenciais para departamentos jurídicos que precisam reduzir riscos operacionais, fortalecer o compliance e garantir que a automação funcione de forma segura, transparente e alinhada às políticas internas. 

Riscos e responsabilidades

O uso intensivo dessas tecnologias traz desafios que não podem ser ignorados. Entre eles:

  • Alucinações e erros de inferência, que exigem verificação humana rigorosa;
  • Proteção de dados e sigilo profissional, amparados pela LGPD e pelo Código de Ética da OAB;
  • Dependência excessiva da automação, com risco de perda da criatividade e da autoria intelectual.

Em última instância, a responsabilidade pelo conteúdo jurídico permanece humana e intransferível.

Supervisão e estratégia continuam centrais

A IA é, acima de tudo, uma ferramenta de ampliação de capacidades. Seu uso exige planejamento, avaliação de custos e alinhamento ético.

O que muda não é o propósito do trabalho jurídico, mas a arquitetura operacional que o sustenta. Quando todas as etapas são integradas em um único ambiente, do intake à definição da estratégia final, o advogado passa a atuar com mais clareza, velocidade e controle sobre cada fase do processo. A inteligência artificial deixa de ser um acessório pontual e passa a funcionar como uma infraestrutura invisível, capaz de potencializar a interpretação, fortalecer a argumentação e conferir mais precisão às decisões. É essa mudança estrutural, e não apenas tecnológica, que está redefinindo o desempenho jurídico no dia a dia.

Com menos esforço operacional e mais tempo para pensar estrategicamente, o advogado se reencontra com a essência de sua profissão: interpretar, argumentar e decidir com inteligência – agora, também com o apoio da inteligência artificial.

*Fabricio Visibeli é Partner R&D (Research and Development) na CBYK, empresa de serviços multidisciplinares


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Fonte Oficial: https://startupi.com.br/do-papel-a-inovacao-a-revolucao-da-inteligencia-artificial-no-direito/

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