As COPs terão de voltar ao papel regulador e mandatório que adotaram no Protocolo de Kyoto para promover uma transição energética realista
Por José Goldemberg*
A Convenção do Clima foi adotada no Rio de Janeiro em 1992 com a presença de 179 países, entre os quais mais de 100 chefes de Estado. A convenção reconheceu que a emissão de gases resultantes da queima de combustíveis fósseis (e do desmatamento) estava aumentando com consequências danosas para o clima. A convenção não fixou prazos e metas para que as emissões fossem reduzidas, mas dividiu os países em dois grupos: os industrializados, que são os maiores emissores e que deveriam reduzi-las, e os demais países, que deveriam receber apoio dos industrializados para fazê-lo.
A convenção não previu sanções para o não cumprimento de suas decisões, mas adotou o procedimento de só tomá-las por consenso para dar poder aos países mais pobres (maiores vítimas do aquecimento global) e protegê-los de decisões tomadas pelos países ricos. O resultado foi que a tomada de decisões tornou-se extremamente difícil.
Apesar disso, a década de 1990 do século 20 marcou grande aumento da influência dos movimentos ambientalistas, o que levou a Conferência das Partes da Convenção (COP), em 1997, a adotar o Protocolo de Kyoto, que estabeleceu metas e prazos para países industrializados reduzirem suas emissões em 8% até 2012. Os países em desenvolvimento ficaram isentos dessas reduções.
A decisão adotada no Protocolo de Kyoto refletiu o otimismo vigente na época devido ao sucesso do Protocolo de Montreal, que na década de 1980 conseguiu reduzir rapidamente a destruição da camada de ozônio, responsável por proteger a Terra da radiação solar. Sucede que a destruição da camada de ozônio era causada por um único produto: o clorofluorcarbono (CFC), produzido apenas por duas ou três grandes empresas — que foi substituído por outro gás que não destruiria a camada de ozônio. Já o aquecimento global origina-se no consumo de combustíveis fósseis (petróleo, gás e carvão) produzido por um grande número de empresas, sendo difícil substituí-los a curto prazo por fontes renováveis de energia.
Além disso, muitos não compreenderam, na época, que as reservas de combustíveis fósseis não se extinguiriam rapidamente. A escala de tempo para resolver o problema não era, portanto, de uma década como no Protocolo de Montreal, mas de muitas décadas.
Os países europeus cumpriram o protocolo, o que levou à criação de um mercado de carbono e à redução das emissões desses países, mas o Senado dos Estados Unidos — para proteger as indústrias que teriam que reduzir as emissões — vetou a ratificação do protocolo, argumentando que os países em desenvolvimento também deveriam fazê-lo, o que conflitava com o disposto na convenção, que os isentava de reduções. As emissões dos demais países cresceram no resto do mundo e o apoio dos países ricos em ajudar os países em desenvolvimento para reduzi-las não se materializou.
O Acordo de 2015 — que foi apresentado como um grande sucesso — reconheceu apenas a triste realidade de que o multilateralismo que levou à adoção do Protocolo de Kyoto foi abandonado e que cada país decidiria unilateralmente o que fazer para reduzir suas emissões.
Com o agravamento dos conflitos internacionais, as COPs, que se reuniam todos os anos, tornaram-se apenas grandes conferências internacionais que reúnem mais de 50 mil participantes que trocam experiências e exortam os governos a adotar medidas no sentido de enfrentar o aquecimento global. Contudo, o apoio financeiro previsto na convenção nunca se materializou na escala necessária e ficou dependendo de filantropia ou de empréstimos que os países em desenvolvimento não conseguem pagar.
Isso ficou evidente em Belém, durante a COP-30, em que a ênfase foi em adaptação ao aumento da temperatura global, como se a batalha para reduzir as emissões estivesse perdida. Apenas 122 países apresentaram seus planos para redução de emissões: 73 não o fizeram.
O valor educacional das COPs é inegável, pois participam delas organizações não governamentais (ONGs), agentes subnacionais — como Estados e prefeituras —, bem como o setor privado, onde bancos e organizações representativas do comércio e indústria propõem projetos e negócios.
Neles, discute-se o desenvolvimento sustentável em geral, como o desafio urbano, saúde, mineração, segurança alimentar, economia circular, ecossistemas, direitos humanos, indígenas, questões de gênero e outros temas que vão muito além do problema do aquecimento global, que é o objetivo da Convenção do Clima.
As questões fundamentais sobre o financiamento climático não avançaram, exceto por exortações gerais, até hoje frustradas. Até boas ideias, como as propostas pelo governo brasileiro, a exemplo do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) e roteiros para viabilizar novos recursos não tiveram sucesso.
É evidente, portanto, à medida que o aquecimento global e os danos causados por ele aumentarem, as COPs terão de voltar ao papel regulador e mandatório que adotaram no Protocolo de Kyoto para promover uma transição energética realista, com o abandono gradativo dos combustíveis fósseis.
Caso isso não ocorra, outros caminhos — num nível mais elevado que as COPs — terão de ser criados.
* José Goldemberg é presidente do Conselho de Sustentabilidade da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) e foi ministro do Meio Ambiente em 1992, quando foi adotada a Convenção do Clima.
Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo em 10 de dezembro de 2025.
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Fonte Oficial: https://www.fecomercio.com.br/noticia/ascensao-e-queda-das-cops