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ARTIGO, por Rafael Cortez: “O antipetismo no divã – os desafios entre o Centrão e o bolsonarismo”

Os ciclos eleitorais costumam traduzir os principais dilemas da política, termo aqui utilizado como sinônimo da arte de resolução de disputas e conflitos entre os grupos de uma mesma comunidade. Nos sistemas presidencialistas, é a disputa presidencial o momento de organização de como setores econômicos procuram representantes para imprimir sua digital no que se chama de projeto de desenvolvimento.

A história recente mostra que a despeito de candidatos e da dinâmica da campanha, cada disputa presidencial tinha uma “tarefa” a ser cumprida e traduzia um momento particular do debate político. A eleição de 1989 é percebida como a formação do sistema partidário sob a égide da Constituição de 1988.

Não por um acaso, ela foi bastante fragmentada. Ninguém sabia da sua força política e havia uma transição para saber quem seria a direita e esquerda naquele momento histórico. Collor e Lula no segundo turno já antecipava a opção do eleitorado por forças fora do mainstream político.

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O ano de 1994 mostrou a disputa do plano Real. Os tucanos consolidaram seu poder a partir da habilidade do ex-presidente FHC em costurar apoio político para o plano, o que resolveu o problema da hiperinflação. O PSDB se tornou de direita e o PT assumiu seu espaço de rival. A sociedade aprendeu a premiar o bom governo e a inflação se tornou o maior alerta de segurança para classe política.

A disputa de 1998 mostrou que o eleitor só deixa o governo quando enxerga uma alternativa segura. O PT não era a alternativa e FHC é reeleito. Em 2002 houve o esgotamento do “efeito real” e a consolidação da moderação política. O PT vence as eleições e se mostra responsável na condução do governo.

Essa “era da moderação” foi interrompida em 2018 em uma eleição que rompe com a a polarização PT-PSDB, após a combinação entre Lava Jato, recessão econômica e mobilização das ruas. Vence a versão brasileira do outsider político, Jair Bolsonaro.

Essa nova polarização é mais radicalizada. Esquerda e direita se distanciam e governos têm dificuldade em construir coalizões. A estabilidade democrática é ameaçada e dá base para o retorno do então ex-presidente Lula, mesmo após um período na prisão.

O mandato Lula III teria como desafio amenizar os dilemas do risco democrático e de superar a desconfiança dos agentes econômicos. Em um mundo ideal, as questões institucionais ficariam organizadas e o país poderia criar uma fase na sua trajetória de desenvolvimento.

A prisão do ex-presidente Bolsonaro foi vista por alguns como sinal de superação do conflito institucional. A moderação iria retornar e a sociedade deixaria de ver vítima desses polos mais radicais.

Minha leitura é que a disputa de 2026 ainda será marcada pela dualidade petismo e antipetismo na política brasileira. Um olhar para os problemas de coordenação da direita traduz esse dilema. De forma resumida: o chamado Centrão (leia-se classe política tradicional de centro-direita) quer retomar o espaço que em algum dia pertenceu ao PSDB.

Enxergam na prisão de Bolsonaro o momento para retomar o controle desse grupo político, mas temem o efeito eleitoral de romper com o nome mais popular do campo. Os bolsonaristas sabem disso e relutam em apoiar esse projeto, ainda que a retórica pública seja cercada de elogios. Se unidos, as chances de derrota petista seriam maior.

A pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro para a Presidência da República curiosamente trouxe mais incerteza acerca da oferta de candidatos em 2026. Logo após o anúncio da indicação do ex-presidente Bolsonaro, o indicado já sugeriu que poderá eventualmente deixar o projeto de lado, mas que tal decisão teria “um preço”.

Por ora, a leitura é que o termo “pré-candidatura” deve ser aplicado ao projeto do senador fluminense. Dito de modo mais direto: a decisão pela candidatura de Flávio ainda não está pronta. O núcleo familiar, por sua vez, ainda não encontrou a melhor forma de lidar com seus “rivais” no campo da direita e era ameaçado pelas disputas entre os filhos e Michelle Bolsonaro.

A pré-candidatura de Flávio visa pelo menos trazer o “ponto focal” do grupo sob a prisão do seu líder. A reação da centro-direita a escolha de Bolsonaro se encontra entre o constrangimento e conformidade. A única forma razoável de aliança entre os diferentes tipos de antipetismo é na chapa presidencial. O governo enxerga tal disputa com mais confiança para 2026.

RAFAEL CORTEZ
Doutor em Ciência Política (USP), professor do IDP-SP e sócio da Tendências Consultoria.

Fonte Oficial: https://agenciadcnews.com.br/artigo-por-rafael-cortez-o-antipetismo-no-diva-os-desafios-entre-o-centrao-e-o-bolsonarismo/

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