Porto Alegre é a terceira cidade brasileira a contar com a categoria Eletric Pro no aplicativo de mobilidade 99, modalidade que abrange veículos eletrificados. A escolha não é aleatória: além do ecossistema local de inovação, a capital gaúcha registra um crescimento consistente de motoristas que já utilizam carros elétricos no aplicativo e que têm a redução de custos como um dos principais benefícios da eletrificação.
A modalidade concretiza uma visão que a companhia estabeleceu há três anos, conta Thiago Hipólito, diretor de inovação da 99 e presidente da Aliança pela Mobilidade Sustentável. A 99 faz parte do grupo chinês DiDi, plataforma de mobilidade que tem mais de 4 milhões de carros elétricos (95% dos novos veículos registrados são elétricos). Em entrevista ao Better Future, podcast do Jornal do Comércio, ele falou sobre os desafios e oportunidades diante desse novo cenário.
Mercado Digital – Qual é a sua expectativa com o lançamento da categoria elétrica da 99?
Thiago Hipólito — A categoria de eletrificado (que compreende tanto elétrico quanto híbrido) é uma visão que a gente tinha há três anos e que agora estamos conseguindo concretizar. O aplicativo passa a ter a opção para que os clientes possam escolher pegar um carro elétrico ou eletrificado. O carro elétrico tem vários atributos relevantes para o lado do motorista, o principal deles é custo.
Ao migrar da combustão para a eletrificação, ele economiza 70% a 80% do custo operacional, o que significa, na prática, R$2,5 mil a R$3 mil líquido na conta. Do lado do passageiro, os atributos são: sofisticação, tecnologia, conforto. O carro elétrico está atendendo essa necessidade, sem dúvida nenhuma. A gente lançou essa categoria no final do ano passado em São Paulo e foi muito melhor do que imaginávamos. Recentemente, foi Brasília. E agora Porto Alegre também entra no hall das poucas cidades que, por enquanto, estamos lançando a categoria.
Mercado Digital – Já são mais de 19 mil motoristas parceiros da 99 operando com carros elétricos ou híbridos e 20 milhões de viagens já realizadas. O que essa experiência traz de aprendizados?
Hipólito — Num primeiro momento, para aprender como seria, compramos alguns carros elétricos e colocamos na frota da 99. Fizemos isso para entender qual era o hábito do motorista, como funcionava essa nova dinâmica no dia a dia e como iríamos fazer para isso funcionar. A experiência do motorista, desde o momento zero, foi incrível. Quando ele migra para o carro elétrico, não quer mais voltar para o carro a combustão. O outro lado, que achamos que seria um gargalo para crescimento, era carregar o carro.
Um veículo à bateria, hoje, roda cerca de 400 quilômetros por dia com a bateria cheia. Isso não é suficiente para terminar o dia, então, como ele vai equilibrar essa nova realidade? Esse foi o principal ponto de aprendizado. Achamos que seria um inibidor para o crescimento, mas os motoristas aprenderam a fazer.
Existe uma grande parcela de motoristas que mora em casas e instala o carregador, faz o carregamento à noite e durante o dia têm uma dinâmica que eles chamam de carga de oportunidade, é quando usam um carregador rápido para concluir o dia. O que seria uma barreira virou uma oportunidade: acabamos de anunciar um aplicativo (99 Recarga Elétrica) que concentra todos os carregadores da cidade e dali vamos levar todos os benefícios para o motorista.
Mercado Digital – Qual é o maior desafio da eletrificação no Brasil?
Hipólito — Tínhamos dois grandes desafios, o primeiro foi justamente o da infraestrutura. O segundo, ainda existente, é a parte de produto, do carro. Para uma adoção massiva, precisamos de um carro que tenha algumas características: boa autonomia (que é algo que conseguimos resolver) e preço (os carros elétricos, comparados aos de combustão, ainda são muito caros). Existe muito benefício financeiro, mas há um salto ainda muito grande entre comprar um carro de R$80 mil e um de R$130 mil. Essa adoção massiva é o que a gente precisa de alguma forma endereçar.
Mercado Digital – De que forma o olhar para o elétrico endereça dores importantes da sociedade e como tem sido a atuação da Aliança?
Hipólito — A primeira coisa é que, pensando no conceito de ESG, olhamos para o S, que é o social. O benefício para o motorista que dirige o carro elétrico é financeiro. O segundo é o ambiental (o E da sigla): cada carro elétrico na rua reduz ou deixa de emitir duas toneladas de CO2 por mês. E o G tem muito a ver com o conceito da Aliança, que é a governança. Como a gente consegue coordenar esse esforço de múltiplas empresas numa direção única, com estratégias deliberadas, com execução combinada. Esse foi o conceito que a gente trouxe para poder impulsionar essa noção, que não é algo simples. Uma nova tecnologia demanda um novo comportamento do motorista; não tem estação de carregamento como se tem posto de gasolina; requer investimento e infraestrutura. Como Aliança, conseguimos coordenar e ter esse plano com uma visão de longo prazo.
Mercado Digital – Que inspirações a 99 traz da China?
Hipólito — A 99 faz parte do grupo chinês chamado Didi, que já tem mais de 4 milhões de carros elétricos. Fui várias vezes para lá e os próprios chineses relatam que agora veem o céu azul, e não mais acinzentado. Há um impacto na prática do uso dos carros elétricos, e usamos isso como referência.
A gente se inspirou na China, principalmente no modelo de como escalar, que foi muito diferente. Em outros lugares do mundo que escalaram, houve um investimento grande em infraestrutura para depois vir a demanda. A experiência da China foi evoluir as duas coisas em paralelo, aprendendo ao longo do processo. De conceito, esse foi o principal, ou seja, como a gente coordena várias empresas integrantes de um ecossistema para criar uma base de escalabilidade mais conjunta.
Mercado Digital – Com a chegada dos carros autônomos, estamos prestes a viver uma nova disrupção no setor?
Hipólito — A minha crença, pensando nas características do carro autônomo, é que isso vai ser muito nichado. A utilização vai ser específica e fará sentido para uma rota com trânsito mais organizado, de um ponto da cidade até um aeroporto, por exemplo. Esse pode ser um caso de uso relativamente simples de ser implementado, e é assim que começa na China e nos Estados Unidos. Você pega uma rota, inicialmente, depois amplia para uma região ainda limitada. Vai controlando e aprendendo. Mas, em trânsito muito caótico, a complexidade é muito maior, e os algoritmos não estão prontos.