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uma escolha ousada e repleta de riscos

A escolha de Belém, no Pará, para sediar a COP30 foi feita em um prazo bastante reduzido: apenas dois anos de antecedência. Em geral, mesmo quando o tempo de preparação é mais curto, como ocorre na COP, as cidades escolhidas costumam ter experiência em receber grandes eventos e já contam com infraestrutura consolidada, o que reduz a necessidade de investimentos vultosos. Para a COP31 no ano que vem ainda não há, inclusive, definição de sede.

Segundo dados da última Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP29, realizada em Baku, no Azerbaijão, cerca de 60 mil pessoas participaram do evento. Trata-se de um público expressivo, que exige infraestrutura robusta em diversas frentes, sobretudo na de turismo: rede hoteleira, restaurantes, montagem de eventos, catering, transporte, entre outros setores de uma extensa cadeia de serviços. Condições que, sabidamente, Belém não dispunha há dois anos.

No Brasil, porém, prevalece a lógica da aposta em projetos de grande porte, muitas vezes sustentados por promessas que, historicamente, não se concretizam integralmente. Os exemplos da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos ilustram bem: grande parte do que foi anunciado não foi entregue, embora os eventos tenham ocorrido graças a soluções improvisadas.

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É inegável o valor simbólico de discutir as mudanças climáticas em um território estratégico para a preservação ambiental, como a Amazônia. A ideia é meritória, mas, isoladamente, insuficiente. Belém ainda carece de infraestrutura compatível com a magnitude da COP30.

Como já era previsto, verificou-se um claro descompasso entre oferta e demanda, resultando em forte elevação dos preços dos serviços turísticos. Nesse cenário, a hotelaria ganhou destaque, sendo apontada como a principal responsável pela escalada dos custos. De fato, há um número razoável de leitos disponíveis, com diárias entre 100 e 300 dólares, negociadas entre hotéis e organização. No entanto, essa oferta não cobre integralmente a demanda e, considerando a cotação atual, tais valores ultrapassam R$ 1,6 mil — patamar considerado muito elevado para uma cidade como Belém.

Diante desse quadro, o noticiário negativo elegeu um vilão: a hotelaria. Trata-se de um equívoco, que funciona como cortina de fumaça para desviar o foco das responsabilidades da decisão tomada, ousada e de alto risco.

Diversas delegações já anunciaram a redução de comitivas ou até mesmo o cancelamento da participação devido aos custos. O governo, sem poder intervir diretamente nos preços, buscou ampliar a oferta contratando dois cruzeiros, medida que ajuda a amenizar a pressão, mas não resolve o problema central. A menos de dois meses do evento, ainda não há confirmações expressivas de participação internacional, e o clima é de desconfiança quanto às entregas, marcado por críticas e pessimismo em torno de uma conferência que deveria inspirar transformações positivas.

Embora o debate atual de preços concentre-se na hotelaria, é previsível que, durante o evento, as críticas se estendam ao transporte e à alimentação, justamente porque Belém não dispõe de infraestrutura para um público estimado entre 50 e 60 mil pessoas. Soma-se a isso a limitada capacidade de conexão aérea da cidade e o elevado preço das passagens.

A hipótese de transferência para outro centro, como São Paulo ou Rio de Janeiro, já foi descartada. A COP30 será em Belém, conforme decisão tomada. Entretanto, a distância entre as promessas e a realidade reforça a sensação de desperdício de legado. A escolha de Belém, diante do histórico brasileiro em grandes eventos, revelou-se uma decisão arriscada, que ameaça ofuscar o propósito central da conferência — o debate sobre as mudanças climáticas —, deslocando o foco para os problemas locais de infraestrutura.

Belém tem um patrimônio cultural rico, uma gastronomia singular e grande potencial turístico. A COP poderia ter representado uma oportunidade de transformação, mas, diante das circunstâncias, corre o risco de manchar a imagem da cidade, em razão de escolhas sabidamente arriscadas.

* Guilherme Dietze é economista e presidente do Conselho de Turismo da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).

Artigo originalmente publicado no portal Hotelier News em 28 de agosto de 2025.

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Fonte Oficial: https://www.fecomercio.com.br/noticia/cop30-em-belem-uma-escolha-ousada-e-repleta-de-riscos

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