Assisti à primeira coletiva de imprensa do papa Leão 14 e, após o evento, diversas matérias destacavam seu jeito descontraído, suas piadas e sorrisos. Isso me fez refletir: até 2023, ele atuava como bispo na Diocese de Chiclayo (Peru), próximo à comunidade, como qualquer outro sacerdote. Agora, simples gestos como um sorriso amigável ou sua maneira de estar entre as pessoas tornam-se notícia.
Isso acontece porque, quando alguém atinge um cargo alto, a percepção das pessoas inevitavelmente muda – até mesmo entre aqueles que costumavam conviver com você. Desde as primeiras civilizações, os chefes tribais eram considerados divinos, escolhidos pelos deuses. Esse conceito criava uma barreira entre líderes e liderados para proteger o caráter sagrado do poder.
E esse mindset ainda persiste. A posição de liderança traz consigo uma série de expectativas e pressupostos, muitas vezes distantes da realidade. Lembro-me de uma live que participei, na qual convidei a vice-presidente de uma grande corporação para inspirar jovens em início de carreira. Foi um bate-papo muito rico, e um momento me marcou bastante: ela revelou que ainda hoje lava louça e cozinha, embora não precisasse. “Precisamos desmistificar essa ideia de que, ao chegarmos a cargos como CEO ou VP, passamos automaticamente a ter mordomos, babás e governantas à disposição,” afirmou.
Eu mesma senti isso na pele ao me tornar presidente do Instituto Mulheres do Varejo. De um dia para o outro, pessoas começaram a me enviar mensagens no WhatsApp pedindo desculpas antes mesmo de falar comigo. Depois de algumas trocas, afirmavam encantadas que nem imaginavam que conseguiriam ter acesso a mim. No começo, achei isso muito estranho. Nosso modelo mental estrutural ainda carrega influências das monarquias e do feudalismo, períodos em que os governantes mantinham distância dos governados, baseando sua liderança na obediência e dependência. Até hoje, essa estrutura reforça a ideia de distanciamento – papas precisam ser formais, e aqueles que fogem desse padrão se tornam notícia. Mas atualmente, essa quebra de paradigma é vista com bons olhos.
Esse cenário também se reflete no mundo corporativo. Muitas vezes, os líderes ainda são pressionados a manter uma postura formal e uma aparência impecável. Neste mês (maio), participei de um evento com executivas e uma delas compartilhou um relato marcante: ao ser promovida ao cargo de C-level, recebeu um comentário inesperado de um dos líderes da empresa: “Agora você não vai mais poder andar com esse cabelo esvoaçante.” Foi então que a nova executiva decidiu valorizar ainda mais seus cabelos, reafirmando que sua forma de liderar não mudaria. Sua atitude inspirou diversos colaboradores que se sentiam desconfortáveis com suas próprias características por causa das “regras invisíveis” da empresa. Ao desafiar padrões, ela conquistou mais engajamento da equipe.
Por muito tempo, acreditou-se que líderes precisavam demonstrar autoridade, não vulnerabilidade. Era como se, ao aceitar um cargo elevado, a pessoa perdesse automaticamente características comuns, como momentos de descontração ou hábitos simples – como lavar louça e cozinhar, citados pela vice-presidente. Por isso, defendo que, para tornar viável a COMUNICAÇÃO (comum + ação) humana, é preciso desafiar as visões tradicionais e mudar a percepção das pessoas sobre liderança. Acredito no equilíbrio. Claro que ele só se estabelece depois de oscilar entre extremos, mas acho que o momento chegou. Não é uma tarefa fácil – um líder carrega grande responsabilidade, pois sua gestão impacta diversas famílias. No entanto, um bom líder pode superar barreiras e construir relações de confiança com sua equipe.
Para mim, grandes líderes criam outros líderes. Eles inspiram pela autenticidade, mostrando que um cargo não define quem são de verdade. Que venham mais papas como o LEÃO 14! E você, qual é o seu perfil de líder?
SANDRA TAKATA
Jornalista, presidente do Instituto Mulheres do Varejo, LinkedIn Top Voice, palestrante, coordenadora e coautora do livro Mulheres do Varejo – Mulheres que Constroem a História do Varejo no Brasil.
Fonte Oficial: https://agenciadcnews.com.br/artigo-por-sandra-takata-o-papa-e-um-ser-humano-e-voce-esta-proximo-ou-distante-de-sua-equipe/