“Lidar com essa pressão no âmbito democrático é desafiador, mas necessário para garantir o interesse coletivo”, escreve
(Arte: TUTU)
Por André Sacconato*
O acordo comercial entre países e blocos é importantíssimo, mas a sua concretização enfrenta obstáculos consideráveis. Renunciar a benefícios obtidos artificialmente, seja por meio de impostos, seja por meio de subsídios, é uma tarefa árdua, especialmente quando grupos de interesse exercem pressão sobre governos.
Recentemente, o presidente francês, Emmanuel Macron, manifestou oposição ao acordo entre União Europeia e Mercosul. Macron justificou esse posicionamento afirmando que o modelo em discussão não pode ser defendido diante dos agricultores europeus comprometidos com metas de descarbonização.
Ele argumentou que esses agricultores não aceitariam a redução de tributos para produtos oriundos de regiões que não compartilhem com essas metas. Em resposta, o presidente Lula mencionou a postura historicamente protecionista da França, mas ressaltando que essa posição é minoritária entre os demais países europeus.
Esse episódio ilustra as resistências internas que comprometem a efetivação de acordos: o bloco europeu busca abrir as fronteiras do Mercosul para os próprios produtos industrializados, que têm vantagens comparativas, enquanto reluta em reduzir subsídios à agricultura, menos eficiente comparada à brasileira. A justificativa da “descarbonização” é usada como argumento, refletindo as complexidades das negociações.
Essa resistência, contudo, resulta em ineficiência econômica. Em uma abertura comercial, há ganhadores e perdedores, mas, em geral, os ganhos superam as perdas, proporcionando um resultado benéfico à sociedade como um todo. No entanto, a pressão política, muitas vezes, prevalece, especialmente quando os perdedores têm maior poder de lobby e influência econômica, como é o caso dos agricultores europeus.
A face negativa dessa conjuntura reside na cooptação do Estado pelo setor privado. Interesses de grandes empresas, frequentemente, sobrepujam o bem coletivo, prejudicando principalmente os mais vulneráveis. Essa conversão não apenas compromete a criação de riquezas no curto prazo, como também mina o crescimento de longo prazo, ao canalizar recursos para projetos menos eficientes e deteriorar a produtividade.
Lidar com essa pressão no âmbito democrático é desafiador, mas necessário para garantir o interesse coletivo. Infelizmente, a viabilidade do promissor acordo entre a União Europeia e o Mercosul está ameaçada nessas condições. No fim, todos perdem, a menos que haja uma vontade política decisiva do outro lado do Atlântico, uma perspectiva que, até o momento, parece distante.
*André Sacconato é economista, consultor da FecomercioSP e integrante do CEEP.
Artigo originalmente publicado no Portal Contábeis em 8 de dezembro de 2023.
Saiba mais sobre o Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP).
Inscreva-se para receber a newsletter e conteúdos relacionados
Fonte Oficial: FecomercioSP