Os empresários podem recorrer aos índices oficiais como o IPCA ou o IPCA-15 para reajuste do aluguel
(Arte: TUTU)
Boa parte dos aluguéis comerciais e residenciais sofreu reajuste em torno de 23% em 2020, alta que afetou sobretudo os negócios que estão tentando equilibrar os gastos mensais com a queda na receita.
Estes contratos de aluguéis são corrigidos de acordo com o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M). Em comparação, a inflação no País, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ficou em 4,5% em 2020, bem abaixo dos 23% do IGP.
A situação de crise nas empresas é, também, uma oportunidade de reavaliar a utilização desse indexador nos contratos, já que, na prática, o custo final do reajuste gera insegurança jurídica à pessoa física ou ao empresário, que muitas vezes buscam revisões na Justiça, defende o Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
O IGP tem algumas particularidades negativas para o locatário.
1 – Está suscetível aos choques no câmbio, com oscilações que ficam acima dos demais índices de inflação em momentos de depreciação cambial.
2 – É projetado para proteger quem recebe o reajuste, principalmente se a necessidade for reagir a uma disparada do dólar.
3 – Os aumentos são computados duas vezes: se o aço sobe de preço no atacado, isso é captado num primeiro momento pelo IGP-M (cuja composição conta com o índice de preços específico do atacado). Num segundo momento, quando os preços dos produtos derivados do aço subirem, novamente o IGP-M vai refletir esta pressão, pois sua composição também conta com um índice de preços ao consumidor. Com isso, a mesma alta de preços será computada duas vezes.
Como a alta causada pelo IGP sobre alguns preços é mensurada tempos depois pelo IPCA, a enorme diferença entre ambas as taxas tem impacto direto na inflação que afeta todos.
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A FecomercioSP foi a primeira entidade, ainda na década de 1980, a questionar os efeitos da utilização indiscriminada do IGP como indexador, por não refletir a realidade de custos e preços de várias situações, além de seus reflexos “realimentadores” da inflação.
Atualmente, o IGP é um indicador inadequado para ser utilizado como indexador de contratos de aluguéis comerciais ou residenciais. Existem índices muito mais aprimorados, produzidos com rigor científico, seja no âmbito do consumidor (IPCA e INPC do IBGE, e IPC-Fipe), seja em relação aos custos de produção (IPP do IBGE).
O IGP foi o pioneiro a aferir com amplitude a alta generalizada de preços. Nos anos em que havia uma desconfiança justificada com manipulações dos índices oficiais, o IGP servia como referência do real comportamento do custo de vida. Hoje, especialistas têm acesso a todas as tomadas de preços, de todos os índices, em todas as regiões e atividades, de forma que seja inconcebível que ocorram manipulações nos indicadores oficiais do IBGE.
Indexação automática deveria ser extinta
Um dos ruídos ainda presente em nossa economia é exatamente a indexação de preços, que torna muito complexa a gerência da política monetária – que passa a ter de lidar não apenas com as perspectivas puras para o futuro, mas também com os efeitos de “realimentação” do passado, reitera o CEEP.
A indexação automática em contratos deveria ser extinta no Brasil. A cada vencimento de contrato, deveria ocorrer um novo processo negocial, para manter o equilíbrio entre as partes. Contudo, ainda prevalece o vício de se gerir as relações pela inflexibilidade, sem a cultura da negociação.
Para o varejo, o IGP é o principal indexador dos contratos de aluguel, um custo bastante expressivo nos gastos do varejista, principalmente os de pequeno porte. Independentemente deste momento de crise, é essencial se disseminar um índice que reflita de forma mais próxima possível a realidade da empresa, em vez de um que pode se descolar significativamente da real situação do mercado em que opera.
Histórico do IGP e o problema de metodologia
Até o início da década de 1980, o IGP era o indicador oficial da inflação no Brasil, sendo substituído pelo IPCA desde então. Com essa mudança, passou a ser amplamente utilizado como indexador de contratos de médio e longo prazos, como aluguéis residenciais e comerciais, e até mesmo tarifas públicas. O IGP é dividido em três indicadores: IGP-DI, IGP-10 e IGP-M (a diferença entre eles está no período de coleta de dados).
Por ser um indicador de preços composto, que agrega preços no atacado, no varejo e de materiais de construção – com fatores de ponderação fixados há várias décadas – é atualmente um índice complexo de ser compreendido, defende o CEEP. A estrutura do indicador, desde 1947, é composta 60% pelo Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) – ou preço por atacado –; 30% pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC); e 10% pela variação do Índice Nacional de Custo de Construção (INCC).
O que se obtém quando se junta todos esses indicadores ponderados a 60%, 30% e 10%, respectivamente, há sete décadas? questiona o conselho. Não há registro no mundo de agregação tão peculiar, produzindo um índice híbrido de inflação. Mesmo se aceitando esta mistura, não há nenhuma justificativa para se manter inalterada a composição de 60%, 30% e 10%, qualquer que tenha sido a razão técnica original da ponderação. Manter como está é ignorar as grandes transformações da economia brasileira dos últimos 74 anos.
Na década de 1980, a FecomercioSP questionava este cálculo com abrangência restrita, tendo em vista que, naquela época, o INCC e IPC (custo de construção e preços ao consumidor) eram apurados apenas no Rio de Janeiro. No caso específico do IPA (preço por atacado), preponderante no IGP, parte da coleta de dados ainda é feita com base em preços de lista que, muitas vezes, não são os efetivamente praticados.
Na maioria das vezes, essas listas são meras referências ou sugestões de preços da indústria para o varejo, poucas vezes sancionados integralmente. O estudo da FecomercioSP na época teve repercussão imensa, inclusive com as autoridades econômicas, que passaram a disseminar e a estimular o uso, a depender do caso, do então recém-criado IPCA nos contratos com cláusulas de reajuste.
O que o empresário pode fazer
Para o empresariado do comércio, a FecomercioSP recomenda que não sejam aceitos contratos com cláusula de correção baseados no IGP-M, ou em qualquer indicador, sem antes analisar o conteúdo, pois o grau de incerteza gerado pelo índice pode se tornar um foco de aumento de custos fixos em níveis imprevisíveis. Pelas circunstâncias atuais, a tendência é de que o preço do contrato ajustado pelo IGP continue sendo pressionado para cima no curto prazo em relação a outros indicadores, pela sua vinculação maior com o câmbio.
Evite também assinar qualquer cláusula de contrato, em especial aquelas que preveem reajustes automáticos de custos, sem avaliar as fontes de receitas e custos da sua empresa.
Nos casos de dúvidas sobre qual seja o indicador adequado, os empresários podem recorrer aos índices oficiais (como o IPCA). Se houver necessidade de dispor de um indicador com maior antecedência, pode utilizar o IPCA-15. O ideal é o acordo caso a caso e a negociação direta entre as partes. Confira algumas orientações de como fazer isso.
Fonte Oficial: FecomercioSP