Esse projeto esbarra em um importante comando constitucional que veda expressamente a utilização de tributo com efeito de confisco
(Arte: TUTU)
Um projeto de lei complementar (PL n.º 34/2020) em tramitação na Câmara dos Deputados quer obrigar grandes empresas a emprestar uma parte do lucro ao governo como uma forma de auxiliar o Poder Público no combate ao novo coronavírus (covid-19). Essa proposta estabelece o empréstimo compulsório (obrigatório) durante o período em que durar a calamidade pública.
Para a FecomercioSP, a medida é totalmente inconstitucional e pode prolongar a crise econômica por vários anos, comprometendo recursos essenciais às empresas para garantir estabilidade aos funcionários e a manutenção dos empregos. A Entidade encaminhará um ofício ao Presidente da Câmara e ao autor da proposta, apresentando todos os pontos jurídicos que tornam esse projeto inconstitucional e os fatores econômicos que inviabilizam sua execução.
A Federação entrou em contato com o Poder Público propondo uma série de ações para minimizar a crise sobre os setores de comércio, serviços e turismo. Conheça as reivindicações da FecomercioSP aos governos federal, estadual e municipal.
Tramitação
Atualmente, o projeto de lei está aguardando a definição do regime de tramitação e as respectivas comissões para debater o texto. Se passar por todo o trâmite no Congresso e for sancionado pelo governo, as empresas brasileiras com patrimônio líquido acima de R$ 1 bilhão serão obrigadas a emprestar até 10% do lucro apurado nos 12 meses anteriores à publicação da lei no Diário Oficial da União (DOU).
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Pelo texto, esses valores deverão ser pagos pelas empresas ao governo em até 30 dias a contar da publicação da lei. O Ministério da Economia definiria o porcentual aplicável a cada setor econômico para cálculo do valor do empréstimo compulsório, de acordo com a necessidade total de recursos.
Principais detalhes do PL que institui o empréstimo compulsório:
• Quando o montante a ser pago pelas empresas superar R$ 1 milhão, o pagamento poderá ser parcelado em até três vezes;
• Os valores recebidos a título de empréstimo compulsório (e que forem utilizados) deverão ser restituídos aos contribuintes em até quatro anos a contar do fim da situação de calamidade pública relacionada ao coronavírus. Os recursos não utilizados serão devolvidos em até 60 dias após o fim da calamidade;
• O montante a ser restituído será corrigido mensalmente pela taxa básica de juros, a Selic;
• Se a empresa não pagar o valor no prazo determinado, terá que arcar com juros e multa de até 30%, caso demore mais de dois meses para emprestar. Além disso, serão seguidos os ditames postos para execução da Dívida Ativa da União, conforme a Lei n.º 6.830/80.
Na justificativa, o autor do projeto, o deputado José Wellington Roberto (PL/PB), diz que tal medida é necessária pelo fato de o governo ter de gastar mais do que o previsto para combater a pandemia. Ele ressalta que essa opção tributária encontra respaldo na legislação infraconstitucional e que o empréstimo compulsório vai garantir mais celeridade e desburocratização dessas despesas, mas que isso não representaria uma ação confiscatória do patrimônio.
Projeto é inconstitucional e pode gerar dano grave e prolongado à economia
A FecomercioSP se posiciona de forma totalmente contrária a esse projeto de lei por entender que é inconstitucional. A Federação reforça que o empréstimo compulsório em situação de calamidade está estabelecido na Constituição Federal, mas como condição a essa medida, o Código Tributário Nacional exige que o governo federal esteja incapacitado de enfrentar a crise com os recursos orçamentários já disponíveis.
Para um país com nível de renda per capita tão abaixo das maiores economias do mundo, os 36% da carga tributária atual extrapolam qualquer condição de aumento desse custo tributário, pontua a Entidade.
A Federação reitera que esse projeto de lei esbarra em um importante comando constitucional que veda expressamente a utilização de tributo com efeito de confisco (inciso IV, do art. 150, da Constituição).
Há outras alternativas possíveis, inclusive sob o manto do Poder Legislativo, como a denominada “PEC dos Fundos”, que permite a utilização de cerca de R$ 200 bilhões disponíveis em 280 fundos públicos, recursos que poderiam financiar as necessidades emergenciais do setor de saúde.
Essa ação do Legislativo elevaria a carga tributária do País em parâmetros fora da realidade mundial, impedindo a competitividade externa das empresas e sucateando a estrutura produtiva nacional. Também criaria um ambiente que inviabilizaria a retomada do crescimento por vários anos, com níveis de renda deteriorados e desemprego em patamar muito alto, comprometendo a poupança interna e os investimentos.
Em posicionamento recente, a FecomercioSP já deixou claro que o papel do governo neste momento é injetar recursos na economia para evitar que uma crise de meses se prolongue por anos. É essencial que o Poder Público esteja focado em planos e medidas para reavivar a economia durante e após crise, sem que isso comprometa a segurança jurídica aos negócios com medidas que repercutam negativamente na imagem do Brasil no exterior.
Fonte Oficial: FecomercioSP